No mês de julho os núcleos NEPGS e NEABI organizaram uma série de ações em alusão ao dia 25 de julho, Dia Internacional da Mulher Negra Latino Americana e Caribenha. Foram depoimentos, imagens, vídeos e rodas de debates.
Confira algumas ações realizadas.
Pretas do IFRS Osório: histórias de estudantes do Campus,
"Meu nome é Maria Luiza Conceição, tenho 18 anos e minha trajetória com a minha própria negritude é um tanto quanto nova, até pra mim mesma. Desde sempre meus pais sempre me incentivaram a abraçar a minha cor e me sentir 100% confortável comigo mesma, mas mesmo assim a jornada da aceitação não foi tão fácil. Depois de muito tempo achando que pequenas brincadeirinhas e piadas do dia a dia eram um simples bullying ou uma exclusão qualquer, depois de danificar meu cabelo com diversas químicas e por mantê-lo preso todos os dias por basicamente 10 anos da minha vida, de ser chamada de mulata, moreninha, ou qualquer adjetivo que não use a palavra negra e me diminuíssem, afinal “tu nem é tão escura assim” o dia da saída do armário negro chegou. Algo muito importante pra mim dentro da minha descoberta, foi ter conhecido e me aproximado de diversas pessoas negras que me faziam sentir igual e compreendida. Além de tudo, conheci mulheres negras incríveis que marcaram a minha trajetória e que eu serei eternamente grata por terem cruzado meu caminho e me mostrarem que não há resistência sem união. Hoje em dia, sigo pesquisando mais afundo a luta de mulheres que vieram antes de mim e que lutaram para que eu possa ter os direitos (mesmo que pequenos) que tenho atualmente. Além de tudo isso, descobri que poderia usar uma das minhas maiores paixões, a arte, para expor minha trajetória, ganhando mais força e voz para lutar. Fico muito feliz com as discussões sobre raça e gênero (e suas intersecções inclusive) estarem acontecendo frequentemente e mais meninas como eu, entendam que elas não estão sozinhas. Tenho esperança de que cada vez mais estamos mais unidos e fortes, nossa luta é diária e nós estamos presentes, sempre."
“Meu nome é Patrícia Ester Borges Da Silva e tenho 17 anos, fiquei órfã aos meus 10 anos de idade e sempre sofri com a meritocracia e desigualdade social. Meu primeiro contato com o racismo foi quando um colega do fundamental disse “negrinha” em um tom baixo, mas com muita agressividade, eu fiquei sem reação, hoje entendo que ele estava falando da minha própria identidade negra, que naquela época eu desconhecia.
Mas nem sempre é fácil reconhecer, aceitar e entender que a supremacia branca nos classifica e rotula como seres inferiores, sem responsabilidade, sem capacidade intelectual. Passei meu fundamental todo me questionando porque era diferente das outras meninas, cresci com a falta de representatividade e minha mente me castigava por estar fora do padrão imposto pela sociedade, eu pensava que era “feia” simplesmente por não ser branca, ter olhos claros e corpo definido. Comecei meu processo de aceitação logo quando entrei no IFRS, entendi meu lugar, minha fala, minha história o meu próprio eu! Reconheço que sofri, e sofro racismo inúmeras vezes e em diversos ambientes. A ideia que sempre foi imposta pra mim, é uma ideia de limitações “você não pode usar isso, não combina com seu tom de pele”, “você não é negra, é moreninha”, “negra só pensa até o meio-dia, após isso não pode opinar”. Me limitaram tanto, que hoje tento me reencontrar, sair da “caixa”, me permitir!. E como diria Ângela Davis “Não aceito mais as coisas que não posso mudar, estou mudando as coisas que não posso aceitar.”
"Meu nome Eugênia Paim e tenho 18 anos. Ao longo de toda minha vida nunca me foi dito que eu era de fato uma mulher negra, apenas diziam que eu tinha o cabelo duro e eu era feia e que ficaria feia se eu não alisasse o cabelo. Isso fez com que até meus 14/15 anos eu apenas usasse meu cabelo preso, e depois disso eu comecei a alisar, isso durante dois anos. Até que aconteceu o famoso corte químico e meu cabelo caiu MUITO, então eu resolvi fazer um sidecut, e depois disso continuei com a química, até que um dia decidi fazer um corte dito “masculino” deixando meu cabelo bem curto. Quando eu fiz isso minha autoestima subiu muito e só a partir daquele momento eu comecei a me sentir bem e aceitar meu cabelo como ele é. Esse foi um dos passos mais importantes na minha descoberta como mulher negra. Depois disso uma das coisas que mais me ajudaram foi o meio no qual eu estava, no IF há muitos projetos e pessoas que te ajudam a se descobrir quando ainda existe uma dúvida ou/e uma insegurança de si em meio a sociedade. Em meio a toda essa trajetória eu fui descobrindo a arte como uma válvula de escape, eu tanto aprendia, como me expressava através dela, e com isso fui crescendo e descobrindo o que eu poderia fazer. Em um futuro próximo eu ainda espero trabalhar com arte dando visibilidade a pessoas pretas e quem sabe inspirar tais com minha arte. Depois de muito aprender sobre o movimento negro e sobre o racismo estrutural eu fui conseguindo desconstruir uma visão embranquecida que eu tinha sobre mulheres negras e consegui ver nelas uma beleza superior a que eu via em mulheres brancas (e eu não estou falando de aparência). Considero isso uma das minhas maiores evoluções, pois além de me aceitar e ver beleza em mim eu ainda vejo isso nas minhas irmãs pretas."
“Olá, meu nome é Ingrid Santos Caetano e tenho 20 anos. Sou filha de pais negros que sempre me apoiaram e são meus maiores exemplos, em uma família bem miscigenada, considerada a cara do Brasil. Sou uma menina bem comunicativa, feliz, resistente e curiosa. Essas características que me ajudam e ajudaram a enfrentar qualquer tipo de fase ruim durante toda a minha vida. Sempre fui muito esclarecida e consciente sobre tudo que representa ser Negro no Brasil. Me redescobri como mulher negra, no momento em que eu decidi parar de usar química no cabelo (alisava desde os 13 anos) para começar o processo de reconstrução capilar, isso a um ano e meio .Venho resgatando a minha origem e ancestralidade através das tranças, que eu amo, super me identifico e estão sendo fundamentais nesse processo do crescimento saudável do meu Black. Fico muito feliz por ver essa "maré" boa de representatividade crescendo cada vez mais, o povo negro vencendo, conquistando seu espaço e mostrando que é capaz".
Meu nome é Maysa da Silva Rosa, tenho 18 anos e moro com meus pais e meu irmão. Meus pais e meu irmão sempre me apoiaram em tudo no que eles podiam. Minha mãe principalmente, ela sempre me ensinou a me defender do mundo, pois o mundo é um lugar muito cruel para certas coisas. Quando se é criança não sabe muito bem o que isso quer dizer. Desde os quatro anos de idade sempre estudei na mesma escola, e nunca tinha sofrido algum tipo de preconceito relacionado a minha cor, não sabia nada sobre as histórias dos meus ancestrais, nada sobre conceitos raciais. Até que um dia, em uma discussão na sala de aula, uma colega minha soltou “não vou perder meu tempo discutindo com um negrinha”, essas palavras me afetaram de um jeito que nunca tinha me afetado antes, mas por um bom tempo ignorei esse acontecimento.
Entrando no IF que eu pude perceber de fato o que tinha acontecido há uns tempos atrás, foi no IF onde eu pude respirar de verdade, coisas que eu jamais sonharia em conhecer e aprender, conheci e aprendi. Aprendi o meu lugar na sociedade, o lugar de uma mulher preta, e então só assim as coisas que minha mãe disse quando eu era criança começaram a fazer sentido, pois o mundo, para uma mulher preta na sociedade, é totalmente cruel. Vejo pessoas igual a mim morrerem todos os dias, só pelo simples fato de ter uma cor diferente do “padrão da sociedade”. Isso traz um sentimento de medo, medo do que possa acontecer comigo, medo de não conseguir voltar pra casa e ver minha família. Mas também é esse sentimento de medo que faz eu levantar a cabeça e lutar pelos meus direitos, de lutar pelo meu lugar na sociedade, lutar pelos meus ancestrais que tenho tanto orgulho e lutar pelas pessoas que não tem o privilégio de ser ouvidas.
Vídeo: relato da psicóloga Sida Maiá, uma mulher potente e inspiradora.
Comments